terça-feira, 6 de abril de 2010

A distância criada e a saudade ausente

Vivemos em um mundo onde a distância é um bem que não mais existe.

Pensem comigo: quem é que mora longe dos pais e sente aquela imensa saudade de doer? Cada vez menos pessoas! Simplesmente pelo fato de que, atualmente, o MSN, o orkut, o skype, o facebook e o e-mail diminuíram as distâncias, construindo pontes virtuais entre as pessoas.

Pontes virtuais! Trocou-se o real pelo virtual, e a saudade real foi substituída pela pseudo-presença virtual.

E então? O problema é que as pessoas são completamente diferentes pessoalmente. As experiências são muito mais valiosas e intensas no téte-à-téte... Sem contar que, no mundo virtual, você conversa com várias pessoas ao mesmo tempo, deixando de se entregar totalmente a cada uma delas, o que mitiga os relacionamentos.

Quanta saudade eu tenho do tempo em que, para falar com a paquerinha (isso no início dos anos 90), era preciso ligar na casa dela, passar pelo filtro do pai e do irmão mais velho ("oi, a mariazinha tá aí?"), sentir aquele tremendo frio na barriga e titubear por vezes antes de discar o número dela.

Hoje a situação facilitou demais. Antes de conhecer a pessoa você entra na rede social dela, visualiza todas as fotos, as comunidades para conhecer os seus gostos e desgostos, prepara-se com todo esse conteúdo e "liga pra casa dela"? NÃO! Você a adiciona no MSN, coloca aquela foto em que você está tão lindão quanto a sua mãe te acha, e dá uma de bom moço, já sabendo de quase tudo sobre ela.

Se você tiver um pouco de paciência e não for um mala-sem-alça, você conquista a pessoa via MSN, sem sequer tê-la visto, sentido o seu cheiro, olhado nos seus olhos, enviado uma rosa, sentido um medinho de escutar a voz do pai ou do irmão, e, como em um passe de mágica, "eu te amo" (essa questão da banalização do "eu te amo" vou tratar logo em um outro post). Chato né?Cadê o romantismo das surpresas, o lidar com as diferenças, o olhar transformador e a mão tremendo?

Muito além disso, vamos imaginar que você conheça alguém via "normal". Apaixone-se por essa pessoa, comece a sair com ela e acabe namorando. O seu namoro vai ser afetado diretamente por toda essa parafernália digital. As cartinhas de antigamente (tem muita gente que tem uma caixinha e as guarda junto com outros pertences) perderam o sentido! Hoje são "depoimentos ocultos", "scraps", e, muuuuiiitoooo dificilmente, e-mails curtíssimos e sem desenhos, que não são guardados em caixas, mas sim em algum lugar virtual o qual ninguém sabe onde fica.

Meu caro, o seu relacionamento (seja familiar, amoroso, amizade) vai sobreviver lastreado por um fio muito estreito, tão fino quanto a linha que liga o seu notebook à rede sem-fio, ou o seu celular do seu receptor. Rodeado de SMS, depoimentos, pequenos e-mails, o seu sentimento será, tal qual os seus adereços, cada vez mais virtual e menos real. E isso é muito perigoso, ao passo que distancia as pessoas com a falsa impressão de que elas são e estão mais próximas.

O risco que se corre é o de viver virtualmente, esquecendo que o virtual é somente mais um dos meios para se facilitar a vida real, não para substituí-la! O virtual, por si só, é vazio!

Repito: vivemos em um mundo em que a distância é um bem que não mais existe. E completo: ela foi substituída por uma falsa presença que nada mais faz do que abortar os reais sentimentos antes que eles tenham chance de nascer.

Seja real! E abaixo o vazio!

PS: esqueça daquele exercício matinal de enviar e-mails de piadinhas, educativos ou de alertas para todos os seus contados - esse exercício é péssimo e só afasta as pessoas. Tente ligar para um ou dois amigos durante o dia. Vai fazer muito mais efeito!

segunda-feira, 5 de abril de 2010

11:11 e a política da exceção

Bom, senhores.

Confesso que o primeiro post traz consigo um friozinho na barriga... sem frescuras, passado o inevitável frenesi inicial, pretendo tocar em um ponto que me intriga desde os tempos de adolescente.

Percebe-se, cada vez mais, que as pessoas estão se agarrando nas exceções e delas vivendo. Pense comigo: quantas e quantas vezes você olha no seu relógio e está marcando "11:11", ou "22:22", ou "09:09"? Ou dá um look no ponteiro do carro e o odômetro está com todos os números iguais, do tipo "55.555.55 km"? Pouquíssimas! Tem gente que, inclusive, acha que isso "só acontece comigo..." e que "é algum sinal". Vai entender...

Numa boa: quem é que, quando olha no relógio e está marcando "10:35", pensa: "que doido!1+0+3+5=9, e 9 significa o final de um ciclo e o começo do outro". Ninguém! Porquê? Simples... Pois, infelizmente, a turma se lembra das exceções e ignora todo o resto! Ora, em 24 possíveis horas, tem-se somente 24 possibilidades de se enxergar números iguais em horas e minutos, isso considerando um universo de 1.440 minutos diários. Ou seja, tem-se 1,7% de chances de, a qualquer hora que se olhar em um relógio, encontrar os números iguais. Portanto, os números iguais aparecem excepcionalmente, raramente, por isso a gente sempre se lembra deles e sempre acha "legal", principalmente quando se trata do "00:00", "11:11", "22:22", que são os únicos que se repetem nas quatro casas.

Por alguns instantes, tente lembrar de momentos especiais da sua vida. Não foram as exceções? A sua formatura, o dia em que ele te trouxe aquelas rosas roubadas, o dia em que ela burlou toda a segurança da empresa só pra te dar um beijo, ou, mais simples ainda, o dia em que a sua mãe - ou o seu pai - fizeram aquela mega lasanha com vários tipos de molhos, toda bonitona... todos esses dias não estão, de uma ou outra forma, na sua memória, e com fácil acesso? Lógico! É a exceção ao bife-arroz-feijão-tomatinho-papai-e-mamãe de todos os dias...

Experimenta ser o funcionário-padrão, chegar todos os dias no horário e, dois dias seguidos, chegar atrasado. Agora faz o contrário: pega um caboclo todo atrapalhado, com a mesa bagunçada, desengonçado e atrasado, e dá um jeito dele ficar bonitão e chegar uns dois dias no horário. O primeiro vai levar um mega fumo por ser dois dias igual ao segundo, e o segundo vai ser parabenizado por ser dois dias igual ao primeiro (sendo que o primeiro não ganha parabéns todos os dias e o segundo não leva fumo todos os dias, apesar de ambos merecerem) - e eles serão lembrados por esses dois dias de exceção, quer apostar???

Assim, transportando o conceito para a vida real, faz-se, aqui, despretenciosamente, dois alertas bem parecidos, mas que se completam.

1. Cuidado ao ser o "bonzinho", o "faz-tudo", o "belezão" o tempo todo - estilo "filho que toda mãe queria ter", "genrinho preferido", etc... A sua chance de rodar é imensa, meu caro! E o pior: você vai rodar e não vai entender nada! Simplesmente pelo fato que que ele ou ela, seu amigo, namorado, noiva ou cônjuge, vai lembrar sempre - e com todos os detalhes - das exceções! E quando acontecem as exceções dos "bonzinhos", "perfeitinhos"? Quando eles saem da rota, ou melhor, quando atrasam 20 minutos, erram o caminho, olham desapercebidamente para o lado, bebem um pouco além da conta, não telefonam, ou deixam de fazer alguma coisa que fazem normalmente. O fato de se ater 99% do tempo ao bem, o correto, vai enfatizar demasiadamente todos os seus erros, por menores que eles sejam, de modo que uma pessoa 99% boa acaba sendo lembrada pelos seus 1% ruins. E isso é fato, na maioria das vezes, infelizmente.

2. Do mesmo modo, e por outro lado (ou do outro lado...), acautele-se ao dar tamanha importância às exceções. Tente, com afinco, enxergar o todo, e nele incluir as exceções, como se tudo fosse uma coisa só (e é), afinal, pessoas acertam e erram, sendo que, o que realmente importa, é o conjunto, consciente de que os erros são partes do caminho e fontes do acerto.

O que eu digo não é brincadeira. Quem não tem um amigo todo atrapalhado que, quando faz uma coisinha certa, todo mundo acha a maior maravilha do mundo? Por outro lado, conhecemos várias pessoas que mandam bem o tempo todo e, em qualquer falha boba, são taxadas de fracas, incompetentes, praticamente crucificadas. São as exceções marcando a vida das pessoas... Uma pena! (tanto para o ruim, que é lembrado pelas exceções boas - injustiça - , e para o bom, pelas ruins - idem)

Não sei se você quer ser lembrado pelas suas exceções. Eu não! Penso que a "política das exceções" deve ser levada menos a sério. A exceção, por si só, não faz a menor diferença.

Tentem treinar a memória para se lembrar das coisas boas, e relevar as ruins, sejam elas regras ou exceções.

Aliás, viva o conjunto da obra!